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Amiúde, na curva da rua, encontro bilhetes de comboio usados. Uma ida, uma volta, nunca juntas no mesmo bilhete, dois rectangulos rosas, à antiga, ligados por um agrafe. Porquê tantos, porquê sempre ali? Será uma mulher que os guarda na mão até ao último momento, até à porta de casa, quando o medo de ser descoberta a obriga a separar-se deles? Alguém que costuma fumar ali o primeiro cigarro do dia e em vez do isqueiro, de cada vez apenas encontra o raio do bilhete agora inútil? Apanho-os, não há como não, e leio-os, os bilhetes das viagens de outrém, até os buraquinhos do revisor leio. (Pois, assim pode ser a leitura) Atiro-os fora alguns metros mais longe.
Talvez de mão em mão dêem a volta ao mundo e sejam eles mesmos que vou encontrar, na curva da rua, daqui há umas semanas.
Zero: amiúde é palavra que não se diz. Escreve-se, se tanto. Roubei à um francês que precisava de dizer souvent, mas não queria adaptar a estructura da sua frase. Tão profundo o sulco da sintaxe materna.
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