Jan 22, 2008
sons disparus (1)
Le battement frénétique des centaines de petites ailes métalliques qui virevoltaient pour former les destinations sur les panneaux d'affichage des aéroports.
Libellés :
français,
sons disparus
Jan 21, 2008
Henry Rubi, isbjørn kongen
During the hunting winter of 1937, Henry Rubi planted around his house a fence of 115 frozen polar bears like others would a hedge of arctic roses.
pict : Polar Museet Tromsø.
Jan 18, 2008
la langue des animaux morts
Des langues de cabillaud bacalhao kabeljau, des fraîches, au Portugal on ne les mange que salées.
hier au restaurant de la viande de baleine au menu.
pas possible de manger de la baleine.
L'impossibilité n'empêche pas le bref élan de curiosité.
(pas pour rien que curiosité, mère de tous les défauts)
Quel goût?
je ne saurai jamais tant pis pas grave.
par ma fenêtre (aussi belle que provisoire) un ferry passe sous l'arche du pont qui relie Tromsø à la terre ferme.
les nuits d'ici, nuits de couleur, l'air clair et violent.
l'aurore boréale, par contre, pâle verte, serpente.
on m'attend pour boire et j'ai envie de bavarder.
qu'est-ce que j'ai envie de bavarder.
et ce ne sera que du petit parler.
hier au restaurant de la viande de baleine au menu.
pas possible de manger de la baleine.
L'impossibilité n'empêche pas le bref élan de curiosité.
(pas pour rien que curiosité, mère de tous les défauts)
Quel goût?
je ne saurai jamais tant pis pas grave.
par ma fenêtre (aussi belle que provisoire) un ferry passe sous l'arche du pont qui relie Tromsø à la terre ferme.
les nuits d'ici, nuits de couleur, l'air clair et violent.
l'aurore boréale, par contre, pâle verte, serpente.
on m'attend pour boire et j'ai envie de bavarder.
qu'est-ce que j'ai envie de bavarder.
et ce ne sera que du petit parler.
Libellés :
français
Jan 15, 2008
Jan 10, 2008
floresta profunda
A parede está no chão.
Enquanto os senhores da destruição soubem e descem as escadas, carregados de entulho, Emilia dança na poeira.
Enquanto os senhores da destruição soubem e descem as escadas, carregados de entulho, Emilia dança na poeira.
Jan 9, 2008
botabaixo para cima
Hoje arrancam a parede.
Mas agora ainda está de pé, e Emilia olha para ela, o lápis na mão.
Quer escrever nela um voto de vida nova – tipo fita do bomfim, versão rápida : daqui há umas horas a parede está no chão e o voto obrigado a realizar-se – e quer usar uma lingua que em tempos tentou aprender, a de um povo especialista no afastar e atrair os mais diminutos espiritos das coisas.
Só que de repente lembra-se : há anos, num quarto da casa da mãe, colocou um parquete antigo, faia e algo mais escuro, talvez mogno, em espinha de peixe, recuperado pelo padrasta num hotel da vizinhança que ia para a sucata. O hotel todo, sim. Era (e ainda é) o trabalho manual mais complicado e mais bonito que alguma vez fizera até ao fim. Estava orgulhosa. Debaixo do último taco de madeira colocou um destes votos, naquela mesma lingua. (Na altura era mais fácil, ainda estudava.) Felicidade, dizia o papel. Ou felicidades, nesta lingua não há diferença entre singular e plural.
Poucos anos depois, naquele quarto, a mãe morria.
Emilia deixa de fora a lingua desejada, a lingua rica e retorcida, a lingua nunca dominada, para sempre estrangeira, e escreve as cinco palavras do seu voto na lingua da mãe.
Depois sai trabalhar.
Mas agora ainda está de pé, e Emilia olha para ela, o lápis na mão.
Quer escrever nela um voto de vida nova – tipo fita do bomfim, versão rápida : daqui há umas horas a parede está no chão e o voto obrigado a realizar-se – e quer usar uma lingua que em tempos tentou aprender, a de um povo especialista no afastar e atrair os mais diminutos espiritos das coisas.
Só que de repente lembra-se : há anos, num quarto da casa da mãe, colocou um parquete antigo, faia e algo mais escuro, talvez mogno, em espinha de peixe, recuperado pelo padrasta num hotel da vizinhança que ia para a sucata. O hotel todo, sim. Era (e ainda é) o trabalho manual mais complicado e mais bonito que alguma vez fizera até ao fim. Estava orgulhosa. Debaixo do último taco de madeira colocou um destes votos, naquela mesma lingua. (Na altura era mais fácil, ainda estudava.) Felicidade, dizia o papel. Ou felicidades, nesta lingua não há diferença entre singular e plural.
Poucos anos depois, naquele quarto, a mãe morria.
Emilia deixa de fora a lingua desejada, a lingua rica e retorcida, a lingua nunca dominada, para sempre estrangeira, e escreve as cinco palavras do seu voto na lingua da mãe.
Depois sai trabalhar.
Jan 8, 2008
Noite no Bairro Alto
Não é que me cruzo com o Homem que vende crocodilos-que-puxam-a-lingua-quando-se-lhes-puxa-o-rabo? Para quem não conhece a zoologia da sobrevivência lisboeta, os crocodilos são de papel dobrado, e o homem o único origamista da capital. Vive de vendera sua arte nos restaurantes. Espero que vive. Conheci-o na primeira noite, primeira de todas, primeira de muitas, que jantei em Lisboa. Merece uma medalha de tenacidade. A começar pelo Tchekov, anda muita boa gente a teimar que o que importa não é o que se faz, mas que não se deixe de fazê-lo. Tanto homem a insistir numa coisa que parece não fazer sentido, talvez tenha alguma verdade. Espero. Espero mesmo. Mas perdi-me. O que queria dizer, eu que sou gaja, é que a cara dele, que não via desde o milénio passado, me falou muito alto sem que ele precisasse sequer de reparar em mi. Disse : - Também estás velha, miúda, não olhes assim.
Miúda velha a correr para apanhar o último metro ligada infindavelmente à homem que vende crocodilos. O tempo tem destas coisas. Não há como saltar os paralelos.
Miúda velha a correr para apanhar o último metro ligada infindavelmente à homem que vende crocodilos. O tempo tem destas coisas. Não há como saltar os paralelos.
Libellés :
ler o mundo,
português
Jan 7, 2008
the intimacy of strangers
In a street cafe overlooking downtown, Emilia drinks moscatel in the afternoon sun. Her table has a lot of free chairs and two young turists from London ask if they might join her. One is originally from Iran, the other Albanian from Kosovo. The Iranian is talking, he has beautiful liquid eyes, to Emilia.
- I don’t like french movies, I don’t understand them.
- Which one, for example ?
- The Dreamers.
- The Dreamers ? I don’t know that one.
- You must know it ! About incest, in Paris…
- Oh, this one ! she frowns. - It’s italian, actually.
- You’re only making this face because you’re disgusted by the whole incest thing !
- Me ?!? Oh no ! When I was young I even sometimes wished I had a brother, so I could …
- So you could have sex with him?
- … You could put it that way.
A beat. The boy thinks it over:
- Well of course there is the confidence factor. This way, I mean, if he’s your brother, at least you can be sure he will still be there the next day.
The sudden naked loneliness of it startles the three of them into short silence. Then, fast, the boy launches into how he likes to make breakfast for his lovers, the next day. Because of course he wasn’t speaking of himself. His lovers don’t walk away into the night… Emilia interrupts him almost harshly, speaks of the movie, the actors, anything but the thing.
Then it gets cold. The boys don’t relate this to the setting sun. They say "so nice to have met you, darling" and take a cab to their hotel.
On her walk home, she passes a church on whose wall a tiny note is glued, offering a scribbled message. Always a fool for the handwritten, she picks it up:
Roguemos ao senhor da existência para que não nos deixe confundidos.
Pray the lord of existence (Lord of existence ! Some title ! She sees wind-blown pyramids of decepated heads) that he won’t let us get confused !
Being confused means not being able to tell apart someone who’ll still be there the next day from someone who won’t, for example.
- I don’t like french movies, I don’t understand them.
- Which one, for example ?
- The Dreamers.
- The Dreamers ? I don’t know that one.
- You must know it ! About incest, in Paris…
- Oh, this one ! she frowns. - It’s italian, actually.
- You’re only making this face because you’re disgusted by the whole incest thing !
- Me ?!? Oh no ! When I was young I even sometimes wished I had a brother, so I could …
- So you could have sex with him?
- … You could put it that way.
A beat. The boy thinks it over:
- Well of course there is the confidence factor. This way, I mean, if he’s your brother, at least you can be sure he will still be there the next day.
The sudden naked loneliness of it startles the three of them into short silence. Then, fast, the boy launches into how he likes to make breakfast for his lovers, the next day. Because of course he wasn’t speaking of himself. His lovers don’t walk away into the night… Emilia interrupts him almost harshly, speaks of the movie, the actors, anything but the thing.
Then it gets cold. The boys don’t relate this to the setting sun. They say "so nice to have met you, darling" and take a cab to their hotel.
On her walk home, she passes a church on whose wall a tiny note is glued, offering a scribbled message. Always a fool for the handwritten, she picks it up:
Roguemos ao senhor da existência para que não nos deixe confundidos.
Pray the lord of existence (Lord of existence ! Some title ! She sees wind-blown pyramids of decepated heads) that he won’t let us get confused !
Being confused means not being able to tell apart someone who’ll still be there the next day from someone who won’t, for example.
Libellés :
english,
intimacy of strangers
perdition
Yesterday i wrote the 3 lines under the blogs name.
Today i got unsure and checked perdition. (which for me meant heavy loss, with a subtext of intentional wrecking of one's own ships. "When one burns one's boats, what a very nice fire it makes" writes Dylan Thomas in a screenplay about Jekill & Hide, that's the perdition i meant.
But what perdition primarily means, says the free online dictionnary, is
"a. Loss of the soul; eternal damnation."
Of the soul!!!
after a bit of thinking, i left it standing.
Today i got unsure and checked perdition. (which for me meant heavy loss, with a subtext of intentional wrecking of one's own ships. "When one burns one's boats, what a very nice fire it makes" writes Dylan Thomas in a screenplay about Jekill & Hide, that's the perdition i meant.
But what perdition primarily means, says the free online dictionnary, is
"a. Loss of the soul; eternal damnation."
Of the soul!!!
after a bit of thinking, i left it standing.
Libellés :
english,
zeroglotte - origines
Jan 5, 2008
ler o mundo - pour débutant
A descer a Pascoal de Melo, cruzei-me com um carteiro aflito. Era jovem, barbudo, puxava atrás de si aquele carrinho que só de o olhar percebe-se que não roda nada bem. Quase que se atirou para mi. Tinha uma pergunta urgente: -Faz ideia onde que há aqui uns correios? Fazia. Uns cinquanta metros a frente para ele, atrás para mi, do outro lado da rua.
Então: mais atenção às coisas óbvias, que são as mais invisíveis. Mimetismo protege toda a intenção, nem só as boas, nem só os frágeis.
Então: mais atenção às coisas óbvias, que são as mais invisíveis. Mimetismo protege toda a intenção, nem só as boas, nem só os frágeis.
Libellés :
ler o mundo,
português
Jan 4, 2008
MAIS VALE SÓ?
Depois de muito hesitar ( e se fosse emborar? se isto tudo não servisse para nada? se usasse o dinheiro em coisas mais importantes? ) Emilia ligou ao Senhorio da Voz Servil e depois ao Homem do Orçamento. O primeiro disse-lhe que estava tudo bem, que podia começar com as obras quando quissesse, o que ela repetiu ao segundo. Combinaram para terça feira, porque segunda é mau dia para quem trabalha independente, disse O do Orçamento. E para Emilia, tanto faz terça como segunda.
Só que à noite, na cozinha, as tampas das panelas não queriam parar de cair. E Emilia foi obrigada a lembrar-se do seu fantasma. Vive nos quartos das traseiras, é pacato e afável, não se manifesta muito. Excusa-se dizer que Emilia nunca o viu. Emilia não é daquelas pessoas que vê fantasmas. Esquece-se dele meses a fio. O fantasma é apenas uma espécie de presença, alguém que está sem estar, e sempre lhe pareceu muito bem disposto para com ela. Emilia até gosta do fantasma.
Mas as obras vão arrancar. E se ela tem arranjado para si outro sítio para passar os dez dias da confusão, não seria o mínimo da boa educação avisar o fantasma do transtorno? Oferecer-lhe para poiso provisório aquele que Emilia chama o quarto dos porcos, aquela coisa sem janelas que serve para arrumação de tudo, mas mesmo tudo? Está atafulhado. Quanto espaço precisa um fantasma para se sentir a vontade?
Talvez ele até goste de ter a casa cheia de homens durante uns dias, sempre é uma distração...
Bem, fogo de vista, desconversa...
Verdade verdade, é que Emilia, escolhendo as palavras com cuidado, pôs o seu fantasma a par da situação. Em voz alta no apartamento deserto. Sem rir. Não caiu mais nenhum tampo de panela, mas isto não quer dizer nada: aquela ventania danada dos últimos dias também já não se enfia pela chaminé abaixo.
Só que à noite, na cozinha, as tampas das panelas não queriam parar de cair. E Emilia foi obrigada a lembrar-se do seu fantasma. Vive nos quartos das traseiras, é pacato e afável, não se manifesta muito. Excusa-se dizer que Emilia nunca o viu. Emilia não é daquelas pessoas que vê fantasmas. Esquece-se dele meses a fio. O fantasma é apenas uma espécie de presença, alguém que está sem estar, e sempre lhe pareceu muito bem disposto para com ela. Emilia até gosta do fantasma.
Mas as obras vão arrancar. E se ela tem arranjado para si outro sítio para passar os dez dias da confusão, não seria o mínimo da boa educação avisar o fantasma do transtorno? Oferecer-lhe para poiso provisório aquele que Emilia chama o quarto dos porcos, aquela coisa sem janelas que serve para arrumação de tudo, mas mesmo tudo? Está atafulhado. Quanto espaço precisa um fantasma para se sentir a vontade?
Talvez ele até goste de ter a casa cheia de homens durante uns dias, sempre é uma distração...
Bem, fogo de vista, desconversa...
Verdade verdade, é que Emilia, escolhendo as palavras com cuidado, pôs o seu fantasma a par da situação. Em voz alta no apartamento deserto. Sem rir. Não caiu mais nenhum tampo de panela, mas isto não quer dizer nada: aquela ventania danada dos últimos dias também já não se enfia pela chaminé abaixo.
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